
Apesar da reverência, Carlos em nenhum momento foi intelectualmente submisso a Mário. Desde a primeira carta enviada (de um estudante para um artista muito importante) ele se posicionou firmemente contrário ao que era mais caro a Mário: o orgulho de ser brasileiro. Carlos afirmava: é impossível ser modernista no Brasil, com esse povo atrasado. O sonho frustrado do poeta em sua adolescência era ter nascido francês.

O que incomodava Carlos, como o próprio veio descobrir com as "sessões de análise a distância" dadas pelo de Andrade paulista, não era bem o Brasil ou os brasileiros. Tanto é que logo nas primeiras cartas ele confessa que gosta do Brasil. Só que nunca fez o estilo de Carlos o "escrever em língua do povo", como era a escolha de Mário. O mineiro diz francamente que não concordava em reproduzir na literatura o péssimo vocabulário popular. Mário explica que não escreve propriamente em língua do povo, mas estiliza esse linguajar, criando um dialeto próprio. Pouco depois, Guimarães Rosa faria isso em um nível poético absurdamente refinado.
Se eu não fosse facilmente desmascarado, diria que tive acesso privilegiado às correrspondências entre esses dois grandes intelectuais da arte brasileira. TODA a correspondência dos dois está reunida no tijolaço Carlos e Mário, uma belíssima edição com retratos de ambos, pintados por Portinari.
Apesar das diferenças nunca resolvidas, Carlos e Mário se amavam, dada a constância de cartas que durou até os anos quarenta, quando o último morreu. Eles quase nunca se encontraram pessoalmente, mas eram bastante íntimos. Nas primeiras trocas de cartas ainda, Mário fez essa imagem do que ele sentia quando lia as palavras de Carlos: "você veio com o cigarro na mão, deu um tapinha em minhas costas e perguntou: 'vem cá, te incomodo?'"
Imagens: Retrato de Carlos e Retrato de Mário de Andrade, Cândido Portinari
Alan Araguaia
2 comentários:
Legal! Será que há algum link para as correspondências? Abraços e vida longa ao Controversus.
Idéias revolucionárias?
Tomemos então a frente e falemos com o povo e para o povo. Nós queremos ouvir!
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