segunda-feira, 30 de abril de 2007

Tá olhando o quê?


O que vê pela janela?
Ou através dela?
Qual o seu interior?
O que divide o mundo onde estamos, ou o que observamos do lado de fora?

O que pensa e quem pensa o quê vê?
É um outro mundo?
Ou mesmo mundo dividido?
Há divisão, ou a janela é uma linha imaginária?

O que está lá fora é parte do que está dentro de nós?
Janela física, ótica, espiritual, social?
Janelas da alma?
Seria um balancim?

Fechadas no trinco?
O coração vê o que sente?
Vemos com mãos, ouvidos, nariz, boca...olhos?
Olha o quê, quem, quando, onde, por quê?

Olhou-se?
Auto-imagem, um reflexo?
No escuro, vê-se o quê?
Sua janela está aberta?

Fabíola Corrêa

quinta-feira, 12 de abril de 2007

Belém, caos urbano e social

Surto de dengue em Belém. Problemas respiratórios, alta incidência de viroses; gripe afasta trabalhadores do ofício e deixa “de cama” as donas-de-casa. Mês de abril e a cidade ferve como uma panela d’água em ebulição. A temperatura está nas alturas, e ainda nem é agosto, o período seco do ano. Más previsões? Não, isso é realidade.

Cresce o número de vítimas de assaltos, estupros e outros tipos de violência. O trânsito é caótico – em parte culpa do motorista imprudente, em parte culpa do pedestre irresponsável. Quer mais?

A cobertura vegetal da cidade diminuiu drasticamente e não há uma política efetiva de replantio de mudas. O serviço de transporte público continua a mesma coisa há anos, deficiente, muda somente o preço da passagem. O sistema de esgoto é problemático, não há lixeiras nas ruas, as calçadas dificultam o andar (imagine os deficientes físicos!), há camelôs em todos os cantos e a casa recém-pintada do vizinho já exibe as marcas da pixação.

O preço do tomate subiu. Na verdade, não consegue se fazer uma compra decente no supermercado com pelo menos um salário mínimo. Um salário? Pobre do assalariado!

As ligações telefônicas ficaram mais caras depois da tarifação por minuto (pelo menos na minha casa foi assim). O valor da energia elétrica subiu. O antigo Governo do Estado deixou um rombo de milhões para a atual governadora Ana Júlia pagar. O que ela fez?

Contratou uma cabeleireira e uma dermatologista como funcionárias do governo, que recebiam por esses serviços extras com o dinheiro público, ou seja, o nosso dinheiro! Depois da veiculação dessa notícia em diversas mídias, as moças foram demitidas, mas continuam como prestadoras de serviços à governadora. E quem paga a conta?

Não estou sendo pessimista, e sim realista. Sim, há tantas coisas boas acontecendo na cidade, como o crescimento do cinema alternativo e do teatro, mas essas são pequenas expressões diante a avalanche de desigualdades. Proponho com essas enumerações de que nos demos conta do que acontece em nossa cidade, a nossa casa. Precisamos saber cobrar nossos direitos, mas devemos cumprir com os nossos deveres. Esse é o papel do cidadão, cidadão deixado de lado nessa cidade.

Essa conversa de ser esperto, “passar a perna”, não está com nada! É uma atitude egoísta e contra a civilidade. Mas brasileiro tem essa mania, “dar um jeitinho”! Por isso o país não vai pra frente como desejamos. Crescemos em poucas coisas e regredimos em tantas outras...

As leis não serão cumpridas? Vamos voltar à irracionalidade? Onde estamos indo?



Vídeo crônica "Na Rua". Para pensarmos em nossa condição enquanto humanos e cidadãos de um mesmo espaço físico: a cidade.

Fabíola Corrêa

sexta-feira, 6 de abril de 2007

Santo Deus, Semana Santa


Deus existe. Isso é fato. Quando falam " eu não acredito em Deus", é uma própria afirmação de que Ele existe. Sim, ele está entre nós, ele é parte de nosso ser. Não duvidem do poder divino.

Isso aqui não é um discurso doutrinário, mas revelador enquanto ser humano. Somos uma criação com oportunidades de fazer acontecer nesse planeta. É, a vida não é só passagem, a vida é percepção e respeito ao próximo. Viver é buscar a plenitude do ser até o último suspiro, a sabedoria até que o último livro se feche, o amor até o adeus de um saudoso beijo. Viver, entendem o que é isso?

Não busquem a Deus somente quando estiverem em apuros, agradeçam-no. Diariamente.

Fui batizada e criada conforme os ditames da Igreja Católica, contudo hoje me defino como uma seguidora da sabedoria Divina, livre de dogmas e doutrinações.

Aproveitem a Semana Santa para agradecer, não somente para farrear e comer Ovos de Páscoa. O verdadeiro significado desse feriado está se diluindo, assim como o consumismo no Natal quase ofusca o nascimento de Jesus.

Não esqueçam de Deus, pois Ele não esquece de vocês. Nunca!

Deliciem-se comendo peixe e bacalhau, saboreando ovos de Páscoa (afinal, o prazer de comer - ou gula - é apenas um dentre tantos outros dados à nós), curtam um sol na praia, conversem com amigos, mas não deixem de rezar.

Rezem sempre.

Boa Semana Santa para todos.

Fabíola Corrêa

terça-feira, 3 de abril de 2007

Passagem

Passar é bom:
passar de ano
passar de fase
passar a língua

Até passar a roupa
quando sem preguiça
a roupa fica lisa
fica bonita

Passar é um alívio
passou o sufoco
passaram os homens
passaram os pássaros
Quintana neblina

Dando os meus passos
vou passando pelo paço
e vejo outros passantes
que passam por mim
e passam por si
sós
nós
debaixo dos sóis

Alan Araguaia

Partida


Parte
De uma parte
Dividida em partes
Que partem

Inteiro
...
Ao meio
Que meio?

O meio da parte
Partida na metade
A parte
Partida

Separação
Afastamento
Isolamento?
Não. Busca!

Onde?
Você
Eu
Deus

Meta
De
De
Uno

União
Junção
Encontro
Um.


Fabíola Corrêa

domingo, 1 de abril de 2007

De tarde

Eu estava meio doente nesse dia... às vezes penso que o meu lema poderia ser "Literatura ou Vida!"

Eu não deveria ter cedido ao sono de tarde. A fresca brisa acariciava meu corpo exausto, enquanto pessoas descansadas tratavam dos seus assuntos cotidianos ao meu redor. Certamente dormiram naquela noite, portanto ainda que a brisa as convidasse para uma sesta, conseguiam resistir ao seu chamado. As frases que até pouco me chamavam a atenção, os tons de vozes bem distintos (estudava a arte de conversar, interessante propriedade humana) foram se misturando aos meus pensamentos, perdendo em nitidez. Agora não lutava mais contra as associações mentais, que na maioria do tempo julgava extravagantes e sem utilidade prática. Utilidade prática? Por que diabos me preocupo com isso? O certo é que não mais me preocupava. Estava deliciado em perceber como tudo se encaixava no mundo do sonho, tal qual variações de temas musicais em que as diferentes combinações não comprometem a harmonia da melodia.

Vivi pela centésima vez o episódio em que ela me dizia que podia ser, vamos viver juntos, e um sorriso franco, de excitação plena, emprestava ao seu rosto uma beleza onírica, me enchendo de ternura. Dessa vez ela não era mais ela, tinha faltado ao encontro e enviado uma substituta, como geralmente faz quando sente que está se repetindo.

Eu e ela que não era ela estávamos em uma rua sem carros, em que os pedestres passeavam pelo seu meio. Era uma rua de interior. Passou o meu filho montado em um cavalo, era um homem muito diferente de mim, só que eu sabia se tratar do meu filho, porque olhava como um filho olha um pai. Sem tomar impulso, ele saltou do animal e se encaixou perfeitamente entre os meus braços, que já estavam dispostos de maneira a acolhê-lo. Agora ele era uma criancinha, dos seus quatro anos, que me fitava com um olhar maduro, analisando meus cacoetes e sorrindo de forma irônica, mas amistosa. Eu estava com medo do meu filho, ele tinha entrado na minha alma, vasculhado todos os seus cantos empoeirados e devia conhecer até as áreas mais caóticas.

Aquilo era um pesadelo. Meu filho era um monstro. Um monstro perverso. Ele sabia de tudo, mas ficava calado, assim como essas pessoas que aprendi a evitar. Quis gritar com ele, dizer qualquer coisa como e então, vai ficar aí com essa cara de superior me olhando? Me diz o que estás pensando, exijo que digas, és o meu filho e me trata assim! Eu comecei a mexer a boca, mas logo notei que não saía nenhum som dela, e me resignei. Mas ainda assim queria uma resposta, ele conhecia a minha alma, sabia muito bem o que eu pretendia falar. Quis atirá-lo longe, mas meus braços estavam travados. Quis virar a cabeça de modo que não visse aquela criança insolente. Em vão, estava completamente preso a ele.

Ela que não era ela olhava a cena sem compreender nada. Notava-se pela sua testa franzida e os olhos marrons dilatados. Com essa expressão ela que não era ela me disse que queria casar comigo, e senão pela contrariedade evidenciada em seu rosto, nas suas palavras não se percebiam vestígios de que percebesse qualquer coisa estranha. Casar comigo? Aquilo era um pesadelo. A substituta não havia decorado as falas e improvisava mal. Se pelo menos soltasse uma fala genial, que desmanchasse a minha angústia. Mas falava em casar comigo, muito diferente de podia ser, vamos viver juntos.

Não dava mais por aquela criança estúpida. Ela mantinha a mesma postura de sempre, os olhos não se mexiam, o sorriso irônico continuava o mesmo. As asinhas do nariz não arfavam, apesar da brisa seus cabelinhos encaracolados não se moviam. Devolvi o olhar inquisidor ao pequeno demônio, eu também o conhecia plenamente, não por que tivesse violado a sua alma, mas porque alma ele não tinha. Era apenas um boneco. Senti meus braços novamente. Mas como não tinha medo nem ódio do boneco, não o atirei longe de imediato. Virei-o para um lado, virei para o outro, conferi os seus fundos, e após dar mais uma olhadela de desprezo para aquele rosto sem vida, joguei-o para a calçada.

Ela que não era ela continuava a falar em casar comigo, ter filhos... seu rosto não estava mais perplexo, mas seu sorriso era tímido e receoso, como se adivinhasse que eu não estava gostando daquela vez. Não suporto ver um sorriso daqueles. A compaixão me tomou de assalto, e para evitar que o receio se convertesse em desespero abracei-a firmemente e disse vamos casar, vamos assinar esses papéis, ser abençoados por Deus que a tudo vê e ser felizes com nossos filhos. Lembrei do demoniozinho que me atormentava ainda a pouco, mas descansei ao lembrar que era um truque. Meu filho passou a cavalo, era um homem feito, nada parecido comigo, mas me olhava como um filho olha um pai. Sorriu, estava feliz por me ver com a minha mulher, ela acenou para ele, radiante. Contagiado por tamanha felicidade, quase gargalhei, apertando o antebraço dela. Ela então abriu um sorriso franco, de excitação plena, emprestando ao seu rosto uma beleza de sonho, que me encheu de ternura e amor.

Eu não deveria ter cedido ao sono de tarde. Deveria ter economizado o sono, para gastá-lo à noite, que é quando se deve dormir, que é quando todos dormem para passarem o dia bem dispostos. Agora me reviro, inquieto na cama, lutando contra meus pensamentos absurdos, sedento por um pouco da felicidade que vivi naquela tarde.

Alan Araguaia